Toiros na “Palha Blanco”, uma questão de sensibilidade…

Neste Domingo, 31 de Março, as bancadas da “Palha Blanco” preencheram-se com ¾ fortes de lotação, marcando desde logo uma primeira nota de grande sucesso do Festival de Homenagem ao bandarilheiro David Antunes, que viu como os seus conterrâneos souberam dizer presente para arroupar e render tributo a um maravilhoso Maestro de Prata, que nas bregas dos dois primeiros novilhos demonstrou por várias vezes na suavidade e temple do seu capote o porquê de ter sido um dos Grandes da sua geração. Justiça para um Toureiro!

Tarde de emoções fortes, quer pela já mencionada homenagem ao notável peão de brega, quer pela presença de Marcos Tenório, actuando pela primeira vez em Praça após o falecimento do seu Histórico e Incontornável Pai e que em diversas ocasiões não conseguiu evitar as lágrimas, recebendo o enorme apoio e carinho de todo o público presente, em mais uma demonstração da especial sensibilidade da afición Vilafranquense.

O Festival iniciou-se com a entrega de algumas lembranças a David Antunes por parte do Clube Taurino Vilafranquense (está de parabéns enquanto principal organizador) e de algumas Tertúlias da cidade ribeirinha e teve o seu primeiro grande momento de intensidade no brinde de Luís Rouxinol ao seu bandarilheiro de confiança e amigo de tantas temporadas e a Marcos Tenório, não conseguindo o veterano cavaleiro, também ele, conter as lágrimas. Ovação estrondosa do público, que foi exemplar durante toda a tarde, na leitura e no apoio a tudo o quanto se passou na arena.

O ginete de Pegões enfrentou-se a um excelente novilho do Eng. Luís Rocha, que foi a mais, entregando-se e perseguindo as montadas com alegria e transmissão e que permitiu uma lide onde brilhou novamente a grande altura o binómio Rouxinol – “Douro”, com o primeiro sempre em plano de mestre nas vistosas bregas a ladear, demonstrando ao máximo a excelente expressão toureira do cavalo, ainda mais marcada na forma fabulosa como se redondeia após a colocação dos ferros. Iniciava-se assim o festejo da melhor maneira, com uma mais que agradável prestação, que manteve as bancadas “aquecidas” e interessadas, após os emocionantes momentos prévios.

Pelo Grupo de Vila Franca saltou para a pega o jovem Diogo Conde, o qual após  brinde ao homenageado, viu como o novilho se arrancou pronto e franco, de longe (tinha dado todas as indicações nesse sentido), carregando quiçá em demasia quando o oponente entrou na sua jurisdição, não lhe permitindo sacar-se e recuar com o temple desejado. Ainda assim, logrou uma boa reunião, o que permitiu uma pega de belo efeito, com o voluntarioso “Rocha” a empurrar até ao fim.

Marcos Tenório, que se apresentou vestido de luto (impressionantes aquelas cortesias realizadas também montando num imponente corcel negro!), foi o protagonista de um novo momento de grande emoção, ao brindar, em lágrimas, a sua lide ao céu, para logo deixar o pai orgulhoso numa actuação “marca da casa”, plena de alegria e conexão com as bancadas, que reagiram especialmente à brega “a duas pistas” junto às tábuas, invertendo o sentido, com passagens por dentro das mesmas, o que convenhamos, num redondel com o tamanho do da “Palha Blanco” é tarefa de muito valor e técnica. E o sábio público soube mais uma vez destacar o que de bom foi feito, associado à enorme carga emocional do momento, em detrimento das colocações dos ferros que resultaram menos “ortodoxas”. Terminou com um par de bandarilhas e honrou com toda a galhardia, emoção e dignidade o grandioso nome Bastinhas!

Guilherme Dotti, outro jovem elemento dos Amadores Vilafranquenses foi o escolhido para enfrentar o também muito bom novilho da Casa Prudêncio, o qual, à semelhança do primeiro, carregou e perseguiu sempre as montadas com alegria e emoção, arrancando-se com bravura de todos os terrenos. Após um brinde a Marcos Tenório, vivido num fantástico silêncio (que bem outra vez a “Palha Blanco”!) foi assim com naturalidade que o “Prudêncio” se arrancou que nem uma seta logo que viu o Forcado, entrando com muita velocidade e baixando a cara, ficando a sensação que o Guilherme, além de ter toureado pouco a investida, adiantou ligeiramente a perna, o que o fez ser de imediato derrotado, numa colhida algo violenta. Ao segundo intento logrou subir a terrenos de maior proximidade, onde aparentemente se sente mais cómodo e conseguiu desta vez mandar na investida e reunir com correcção, sofrendo alguns derrotes com o toiro a fugir ao Grupo, não tendo aguentado na cara até à recuperação dos companheiros. Terceira tentativa, já com o primeiro ajuda carregado, mas com o restante Grupo, muito bem, guardando as devidas distâncias (quantas vezes as pegas de mochila, com todos os elementos, acabaram por prejudicar mais do que ajudar a resolver um “problema”?), contando com um excelente momento de todos os restantes Forcados, perfeitos a abafar uma investida muito forte e a pedir muito Grupo, não obstante os meros 390 Kgs. do oponente (os toiros, lá está, nem sempre se medem aos kilos…).

Luís Rouxinol Jr. tão só pode deixar constância das ganas, do valor e da responsabilidade com que enfrentava a sua actuação, num vibrante comprido à porta-gaiola, vendo de imediato como o exemplar de Canas Vigouroux saiu completamente descoordenado da sorte, obrigando à sua devolução a curros, sendo anunciado que lidaria o sobrero em último lugar. Tal não viria a acontecer pela borrasca que se abateu a partir de metade da lide do novilho seguinte, que viria a ditar o fim do Festival.

O mencionado novilho, da ganadaria de Falé Filipe, foi um jabonero, bronco e brusco, frente ao qual esteve em plano de Maestro o veterano Vítor Mendes, fazendo gala de técnica e conhecimento para submeter e dominar as difíceis investidas, numa faena para paladear no plano do poder e da entrega, “santo e senha” de uma gloriosa carreira. A metade da faena de muleta desatou-se o tal dilúvio que obrigou grande parte da assistência a procurar refúgio nas galerias e outra parte a não ter mais remédio do que abrigar-se nas arcadas da Praça, face à brutal queda de água, para a qual muito poucos vinham prevenidos, por mais vontade que houvesse de não arredar pé…

Conheceu assim este agradável e emocionante festejo um final abrupto, ficando inéditos o cavaleiro Luís Rouxinol Jr. e os Matadores Manuel Escribano e Manuel Dias Gomes. Ficam as gratas e intensas recordações e, apesar de tudo, a sábia afición Vilafranquense saiu muito satisfeita, orgulhosa da sua resposta, da sua Praça e da homenagem prestada a dois dos seus: um conterrâneo e um outro que, embora não sendo da Terra e já não estando entre nós, por cima de conceitos e formas de entender o Toureio, terá sempre, como todos os Grandes, um lugar especial nas nossas memórias enquanto uma enorme e inesquecível Figura da Arte de Marialva… Questões de sensibilidade e bom senso, deste castiço redondel à beira-rio plantado…

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