Diz-nos o chavão que vivemos na era das novas tecnologias. Mais do que isso, vivemos na era da comunicação, da internet 2.0, do P2P (pear-to-pear – pessoa a pessoa). Quer isto dizer que vivemos numa era em que não somos meros receptores de mensagens. Somos, muitas vezes sem nos aperceber, emissores para centenas de pessoas de mensagens que criámos ou nos foram transmitidas. O boca a boca nunca foi um veículo de publicidade tão forte como hoje, ainda que haja quem defenda que as novas tecnologias afastam as pessoas ao invés de as aproximar.
Esta evolução na forma como se comunica levou a dois efeitos colaterais (que se resumem essencialmente numa perda de domínio da mensagem que primeiramente foi criada): em primeiro lugar, uma perda de controlo dos meios onde essa mensagem circula (pela capacidade que todos temos de colocar uma mensagem onde quisermos), e em segundo lugar uma perda de controlo na forma e conteúdo da mensagem (qualquer um pode distorcer ou criar “factos alternativos” à volta da mensagem que lhe foi transmitida).
Os agentes taurinos, apercebendo-se desse facto, começaram a ter cuidados redobrados com as mensagens transmitidas. E por mensagem consideramos tudo o que seja comunicação, desde um cartaz a uma simples fotografia numa tenta. Exactamente por essa perda de controlo sobre a comunicação, que facilmente pode chegar a meios não taurinos e de forma deturpada, o mundo dos toiros começou a ter muito mais cuidado com o que se mostra e diz. Porque nós, aficionados, deixámos de ser os únicos receptores da comunicação taurina.
Assim, nos últimos anos, passámos de uma fase em que a comunicação estava exclusivamente voltada para os aficionados para uma fase em que a comunicação é cuidada e voltada também para os não aficionados, com o objectivo essencial de não chocar e tentar que estes se “aproximem”. É aquilo que tantas vezes ouvimos de “chegar a novos públicos”.
Esta evolução da forma de comunicar tem toda a lógica a aparece como vital para a sobrevivência de qualquer actividade. Nada há de errado nisto No entanto, o erro surge quando se começa a desprezar a comunicação com o público que mais interessa: os próprios aficionados. A partir do momento em que a comunicação está de tal forma voltada para os “novos públicos” que passa a não transmitir nada aos “velhos públicos”, essa comunicação passa ter um efeito contrário ao pretendido. O que acontece neste caso é que (em linguagem mais técnica) para se criar “afinidade” com uns poucos, estamos a perder “afinidade” com muitos, que somos nós, aficionados.
Vivemos hoje uma permanente (e excessiva) procura dos “outros públicos”. Os cartazes cada vez mais disruptivos, os termos utilizados cada vez mais “modernistas”, as fotografias publicadas cada vez mais cuidadas para não causar choque. Devo dizer que faço parte dos que gostam desta “modernidade”. Gosto das cores dos novos cartazes do Campo Pequeno, gostei do nome Bullfest, e gosto das fotografias cada vez mais artísticas e cada vez menos “cruas”. No entanto devo reconhecer que não haverá muitos outros aficionados com gostos como os meus. Porque a “tradição” é ainda, se não o principal, um dos principais eixos de sustentação da tauromaquia. Ao abandonarmos de forma tão declarada a “tradição”, podemos estar a perder o grande eixo unificador dos aficionados. Podemos estar a perder a sua identificação com o espect
Se a tradição é afinal uma das grandes razões que leva gente às praças, é necessário que (também na comunicação) saibamos evoluir sem a abandonar totalmente. Porque abandonar as tradições em nome dos “outros públicos” é abandonar os próprios aficionados. É dá-los como adquiridos, e esse é o primeiro erro para se perder “clientes”. Porque os aficionados só estão garantidos quando já compraram o bilhete. São um bem precioso que devemos procurar manter. Não coloquemos o “nós” sempre atrás dos “outros”. Não nos esqueçamos dos aficionados.