Vila Franca – Mais Oportunidades precisam-se!

Vila Franca – Mais Oportunidades precisam-se!

  • 26 de junho de 2022, Vila Franca de Xira
  • Certame Internacional de Escolas Taurinas
  • Manhã: Passanha Sobral | Luís Miguel Ferreira e Francisco Canales & Cayetano Lopez, Miguel Losada, Alejandro Casado e Leonardo; Forcados Vila Franca de Xira
  • Tarde: Palha | Vanessa Cristina e Clara Sofie & Julio Alguiar, Ruiz de La Hermosa, Tristan Barroso e Gonçalo Alves; Forcados Vila Franca de Xira

 

Em vésperas da Festa do Colete Encarnado, mas já com muitas varandas tipicamente engalanadas para receber tão emblemático festejo, a centenária “Palha Blanco” acolheu no passado domingo, dia 26 de Junho, uma jornada dupla de oportunidade aos jovens toureiros e forcados, integrada no Certame Internacional de Escolas Taurinas.

A realização deste tipo de espectáculos é credora dos maiores encómios, para mais ainda quando a empresa organizadora franqueou as portas do carismático tauródromo vila-franquense para que toda a gente pudesse assistir às duas novilhadas populares. A velhinha “Palha Blanco” acolheu umas largas centenas de espectadores, sendo mais forte a entrada da novilhada vespertina, que quase preencheu meia praça. O tempo estava agradável, em termos de temperatura, mas por vezes excessivamente ventoso, o que não ajudou nada os jovens diestros.

 

Os Novilhos

Questiono-me sempre sobre o nível de exigência e de rigor nas análises críticas ao labor dos jovens toureiros que participam neste tipo de espectáculos, tantos são os factores de tolerância a ter em conta.

A começar, desde logo, pelo próprio regulamento tauromáquico que impõe que “As reses a lidar em novilhadas populares têm que ser do sexo masculino, ter mais de 2 e menos de 3 anos de idade e peso entre 300 kg e 400 kg.”. É preciso ter boa noção do que se põe ao dispor dos jovens aspirantes a toureiros para exibirem a sua arte e a sua técnica, pois, como tivemos a oportunidade de observar, a maioria destas reses – que, em bom rigor, nem são novilhos, são apenas erales – não tem poder suficiente para dignificarem a Tauromaquia, tão frequentes são as caídas durante a lide.

As reses que foram lidadas nestas duas novilhadas populares – oriundas das ganadarias de Passanha Sobral, na manhã, e de Palha, na tarde – estavam, em regra bem-apresentados, na casa dos 300 kg., conforme anúncio da empresa, e não dificultaram por aí além o labor de toureiros e de forcados, embora, em termos de condições de lide, os de Palha tivessem saído mais lidáveis, já que os de Passanha Sobral tinham uma investida menos franca, repetiam menos e apuravam mais sentido.

Estas reses têm uma particularidade que deveria ser levada em linha de conta, mas que raramente é observada, tanto pelos jovens toureiros como pelos seus “mestres”. Uma rês com dois anos e cerca de 300 kg. tem pouco poder, pelo que a respectiva lide deve ser muito bem orientada, para dosear o esforço do animal. Não há eral que aguente um número tão excessivo de capotazos de tenteio, mais os quites, a colocação de três pares de bandarilhas e uma faena até ao limite do tempo regulamentar. Naturalmente, têm que cair muitas vezes. Não há milagres! A faena tem uma duração de treze minutos – tanto tempo quanto o que dispõe um matador para lidar um toiro! – e quase todos os novilheiros ouviram o primeiro aviso, o que é sinal de que quase esgotaram este tempo, sem acrescentarem nada em termos de arte ao seu labor nos derradeiros minutos, posto que, nestas condições, o animal já só se defende, tardando nas meias investidas e parando-se. É bom de ver…

 

Os Cavaleiros

Na novilhada matinal tivemos a oportunidade de apreciar as lides dos cavaleiros amadores Luís Miguel Ferreira e de Francisco Canales, e na novilhada vespertina actuaram as jovens cavaleiras Vanessa Cristina e a alemã Clara Sofie.

Entre todos talvez o espanhol Francisco Canales esteja um pouco mais inteirado da arte equestre, acertando mais nos terrenos em que desenhou as suas sortes e recreando-se um pouco melhor na cara dos novilhos para colocar a ferragem da ordem. Os restantes têm ainda um caminho mais longo a percorrer, pois nem se vislumbra uma inspiradora dose de intuição, nem evidenciam técnica e conhecimentos bastantes para desenvolver um labor de qualidade.

Quem quiser ser cavaleiro tauromáquico tem de reunir um conjunto de atributos que possam sustentar a sua legítima aspiração, pois, para tanto não basta ser aficionado e dispor de condições financeiras para fazer face a tão pesado investimento. O toureio, seja a pé ou a cavalo, tem regras que devem ser conhecidas e respeitadas. Para se ser cavaleiro é tão elementar conhecer, e respeitar, estas regras como dispor de boas montadas. Se não, nada feito.

Os novilhos têm os seus terrenos e as suas distâncias e é preciso ter perfeita noção destes aspectos, para que os cites sejam efectuados nos terrenos mais ajustados, e as sortes tenham probabilidade de serem mais bem-sucedidas, pois da escolha dos terrenos e do andamento das montadas depende a qualidade de investida do novilho. Depois, as sortes têm os seus tempos, que devem ser cumpridos. Citar de frente para o novilho, para se mostrar e para provocar a sua investida, eleger os terrenos da reunião, seja nas sortes frontais, à tira ou a sesgo, e depois de colocar a ferragem “en todo lo alto”, pelo que a reunião deve ser ao estribo, deve ter-se a preocupação de rematar a sorte, pelo piton contrário, para equilibrar o novilho e prepará-lo para a sorte seguinte. Tourear a cavalo, não é esperar que os bandarilheiros coloquem o toiro em sorte e em seguida despachar a ferragem, para em seguida ir em correria desenfreada em direcção à bancada para suscitar os aplausos do público.

Estes cavaleiros amadores têm a seu favor o facto de ainda serem muito jovens e de, até por isso, terem muito tempo para aprender, mas é bom que não se deslumbrem com as palmas, que muitas vezes não passam de manifestação de condescendência e de simpatia do público. Entre o público há muito boa gente que não tem a mínima noção do que é o toureio, nem sabe avaliar as condições de lide de um hastado, pelo que as suas ovações, mais ou menos calorosas, devem ser devidamente reflectidas.

 

Os Novilheiros

Duma assentada pudemos apreciar o labor de oito jovens novilheiros, desembaraçados e ambiciosos, que desejam realizar o sonho de serem matadores de toiros. Na novilhada matinal actuaram Cayetano López, Miguel Losada, Alejandro Casado e Leonardo, e na da tarde Júlio Alguiar, Ruiz de la Hermosa, Tristán Barroso e Gonçalo Alves.

Registe-se que todos eles exibiram planta toureira, fruto de boa aprendizagem nas respectivas Escolas de Toureio, onde os seus “mestres” lhes transmitem as boas maneiras de pisar o albero, com elegância e brio, a par do toureio de salão, que se evidencia na forma como manejam os trastes. Mas… claro, ainda falta muita coisa, pois se já soubessem tudo não eram assim tão jovens e, certamente, já eram aquilo que ambicionam vir a ser. Mas o caminho faz-se caminhado…

O afã de mostrar serviço torna-se muitas vezes mau conselheiro, pois as oportunidades são tão escassas que não se resiste à tentação de pôr em cima da mesa todos os trunfos. Estes jovens diestros poderão não lograr atingir o seu sonho, porém, enalteça-se a sua postura e o empenho com que enfrentam, a um só tempo, as oportunidades e os novilhos. A sua atitude lembra-nos uma passagem do escritor José Saramago nas suas “Pequenas Memórias” – “muito sabem os mais velhos o que não podem, e muito podem os novos o que não sabem”.

O saber é a verdadeira matriz que pode escancarar as portas do sucesso, pois as faculdades físicas são inerentes à juventude, mas a arte de tourear exige conhecimentos e ofício. Coisas que só o tempo faculta…

Nesta etapa da sua formação todos carecem de muito aconselhamento e de orientação, pois naqueles momentos a lucidez não é suficiente para administrar a lide, como são os aspectos mais relevantes do tércio de bandarilhas, que, salvo melhor opinião, não deveria ser tão prolongado, e a gestão da faena, que não deve ser tão extensa, porque os novilhos começam a tardar nas investidas e perdem andamento, deixando de repetir as investidas com a fluidez inicial, pelo que, sem surpresas, a qualidade artística vem a menos. Se é verdade que esta leitura do estado dos novilhos ainda não se poderá exigir a estes “alunos”, já não se pode perdoar aos seus “mestres”, que têm a obrigação de saber gerir as suas faenas.

Os treze minutos que pode durar uma faena (10’+2’+1’), contados a partir do primeiro passe de muleta, não têm de ser entendidos como o tempo mínimo para a lide, mas, ao invés, o tempo máximo, devendo a sua duração estar dependente das condições do hastado que se enfrenta.

 

Os Forcados

O Grupo de Forcados Amadores de Vila Franca de Xira teve aqui uma excelente oportunidade para rodar jovens elementos, quer como forcados de cara, quer como ajudas, pois, os novilhos não tinham muito poder e também não saíram complicados.

No entanto, manda a verdade que se diga que os jovens forcados tiveram a seu favor o mérito de não tornar difícil o que se apresentou mais ou menos fácil. Em consequência disto todas as pegas foram consumadas ao primeiro intento, para gáudio do público vilafranquense, que tanto carinho tem pelo seu Grupo, como dos jovens forcados, que alimentam a sua afición e o seu gosto pela arte de pegar toiros com estes pequenos triunfos, que têm o condão de incentivar a sua dedicação.

Os novilhos de Passanha Sobral foram pegados por Gonçalo Pereira e por Rodrigo Camilo, e os novilhos de Palha, foram pegados por Afonso Capricho e por Lucas Gonçalves. Estão todos de parabéns, pois deram muito boa conta do recado.

 

Os Bandarilheiros

Normalmente o labor dos bandarilheiros e peões de brega não é devidamente valorizado nas crónicas taurinas, remetendo-se, por comodidade dos cronistas, para uma apreciação generalizada, que nem sempre é justa.

Mais facilmente se criticam os bandarilheiros pela sua excessiva, e nem sempre adequada, intervenção, do que pelos aspectos positivos do seu labor. Se nas corridas formais a sua actuação depende muito das orientações do cabeça de cartaz cuja quadrilha integram, já neste tipo de espectáculos é fundamental o seu bom desempenho, especialmente dos que são profissionais e detentores de mais conhecimentos e de maior experiência.

Mas, nem sempre tal acontece, porque também eles têm a ambição de mostrar as suas qualidades artísticas. No entanto, deve sublinhar-se que o que se espera dos bandarilheiros mais antigos que actuam neste tipo de espectáculos é uma acção pedagógica, que possa valorizar a função dos diestros mais jovens. Integrar a quadrilha de um praticante – cavaleiro ou novilheiro – deve constituir um acto de generosidade e de abnegação do bandarilheiro em favor do jovem a cujas “ordens” se apresenta e da própria Tauromaquia.

Como sabemos, o regulamento tauromáquico exige sempre a participação de um Bandarilheiro na quadrilha de um cavaleiro ou novilheiro praticante, podendo o segundo bandarilheiro ser também praticante, o que se compreende pela importância de ser um profissional, supostamente, com experiência e conhecimentos para coadjuvar correctamente a actuação dos toureiros praticantes.

 

A Direcção do Espectáculo

Não foi aparentemente difícil dirigir nenhuma destas novilhadas populares, pelo que o Delegado da IGAC que as presidiu não enfrentou grandes problemas. As questões relacionadas com a debilidade de algumas reses foram geridas com ponderação e bom senso, e quando foi necessário devolver um eral aos chiqueiros, por manifesta limitação física, não houve hesitações da “presidência”.

A concessão de música aos artistas e a autorização para a colocação de algum ferro suplementar também não suscitou contestação, embora a recusa à cavaleira Vanessa Cristina para cravar mais um ferro, tenha ferido a legislação regulamentar, posto que a jovem ainda estava dentro do tempo “legal” para o fazer, não tendo até que pedir autorização ao Director. Não foi simpático, porque nesta fase da sua actuação a jovem até estava com a pontaria mais afinada, e poderia moralizar-se com a boa colocação de mais um ferro, mas, sobretudo, não se respeitou o Regulamento.

 

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