Começo por afirmar que, na origem deste texto, não está apenas, mas também, a Fé em Deus e aos Seres Divinos a que cada um é devoto. Na sua génese está algo difícil de explicar através de palavras, mas que tentarei fazê-lo da melhor forma que conseguir. A devoção que leva homens de mãos nuas dar a vida por uma ramagem.
No contacto com muitas pessoas, fora do meio taurino, vezes sem conta, dou por mim a tentar explicar o inexplicável. O amor exacerbado de muitos homens por um grupo, por uma jaqueta e pelo cumprimento de uma arte que se quer futura.
O que leva centenas de jovens, na plenitude da vida, a jogarem-se diante do perigo? Eis a questão. Uns dirão que é loucura, muitos, adrenalina, outros a afirmação da masculinidade ou da fama. Há ainda aqueles que dirão que é a falta de “elevação ética e cultural” ou de que são (somos) “uma cambada de primatas”.
Com estes últimos não perderei tempo, porque só terão acesso ao meu texto, se numa das suas pesquisas controladoras (qual PIDE), derem de caras com estas linhas. Este texto destina-se a satisfazer a curiosidade dos novos aficionados, daqueles que se debatem com a inquietação de ver respondida a questão.
Recentemente, quando tentava responder à questão junto de um amigo menos conhecedor, comecei por explicar o sacrifício que implica ser forcado. Trouxe à conversa a recente peregrinação, os momentos vividos e as imagens retidas de milhares de peregrinos no cumprimento de uma missão junto da Nossa Senhora de Fátima, mas também a atitude do meu querido amigo, irmão, João Rei, que após uma caminhada de 40 km, tinha como única preocupação chegar a horas à fardação do grupo porque, nessa tarde, havia importante compromisso na Palha Blanco, em Vila Franca de Xira.
É realmente difícil de explicar esta forma de estar na vida, esta disponibilidade, para se sacrificar em prol de algo que nada traz além de umas mazelas, dor e, acima de tudo, orgulho e realização. Defendo e quero crer que o que move os homens a vestir uma jaqueta de ramagens e a arriscar a vida diante do toiro, é o Amor que aprenderam a ter à arte de pegar toiros e ao seu Grupo.
O Amor é a razão de tudo o que de bom há na vida. Sentimento por vezes erradamente utilizado para justificar actos irreflectidos, de intolerância e fanatismo. Devemos-lhe os bons momentos vividos junto de quem nos é próximo, da família, dos amigos. Felizmente no seio de um Grupo de Forcados, esses momentos são muitos, onde os jovens são educados com os princípios de amor ao próximo, de partilha do pão, de dar a mão a quem mais necessita. Afinal de contas, valores tão presentes na educação cristã.
Só esse amor justifica que centenas de jovens, na plenitude da vida, na melhor altura do ano, época de férias, praia e convívio com os amigos pelas noites dentro, se predisponham a abdicar de tudo isso para, tantas vezes de baixo de um sol tórrido, se colocarem diante do perigo.
São jovens para quem não existem casamentos, baptizados ou festas se naquele dia e àquela hora houver corrida. Aquele dia é sagrado. Há corrida e ponto final!
É certo que, por vezes, em momentos de maior aperto, surge a dúvida sobre a necessidade de correr tais riscos. Tal como acontece na Fé que temos em Deus, questionarmo-nos, quando nos acontece um problema de maiores dimensões. Mas, mais do que em qualquer outro momento, é nessas ocasiões que não estão sós, estão sempre na presença de Deus e na companhia dos amigos. As inquietações são consoladas com um pedido de protecção divina, um benzer, o pé direito por diante e um abraço mais forte ao lado, vindo de um amigo.
Aprendemos a acreditar que Deus só nos dá o peso que conseguimos suportar e que todos os sacrifícios que nos são pedidos são-no por amor ao Pai. Por isso afirmo que é também a Fé, que nos guia sempre, que designa o amor do Homem ao seu Grupo e à arte de pegar toiros, e que alimenta o desejo e o compromisso de honrar a jaqueta que carrega.
Saibam os mais novos e as gerações vindouras respeitar e compreender a essência do forcado e esta arte não morrerá entre nós!
Nota: A escrita deste artigo não se encontra ao abrigo do novo acordo ortográfico.