Um evangelista e um artista… Joaquim e Uceda!

Com uma nova temporada, ganaderos toureiros e forcados dão início a um novo ano, uma nova jornada na arena da vida… Novos desafios a enfrentar, triunfos, “cornadas a receber”, tudo sempre com a esperança de conquistar a “Porta Grande”. E houve alguma nestes dias…

Ainda no Inverno, que mais teima em ser Primavera… o silêncio e a solidão dos campos onde ganaderos, toureiros e forcados pesam uma nova temporada que vai ficando para trás… Surge o sonho e vai crescendo a ilusão com estes primeiros espectáculos de cada ano! Ser toureiro, ganadero, forcado e, atrevo, também ser aficionado é um projeto de vida e uma forma de viver, diferente de todas as outras… Graças a Deus!

Mourão como cada ano recebe os primeiros Festivais Taurinos em benefício do Abrigo infantil, fundado por um benfeitor daquela Vila Alentejana, Libânio Esquível, este ano dia 1 e 4 de Fevereiro e se no primeiro Festival a Praça estava cheia, hoje domingo rebentava pelas costuras.

O toiro e o toureiro são, evidentemente, os dois pilares de uma corrida de toiros mas com eles, uma terceira “pata” é fundamental para sustentar esta “mesa”: o público. E Mourão foi novamente um mar de gente!

Mourão é tradição, convívio, amizade, festa, mas também é a evangelização de um homem que organiza com esmero estes acontecimentos, Joaquim Grave. E falo em evangelização, hoje no dia 4 de Fevereiro, que até se comemora o dia de um dos grandes evangelizadores portugueses, São João de Brito… Porque realmente apostar e dar a oportunidade dia 1 a miúdos que sonham ser toureiros. É para muito poucos! E evangelizar muito e muitos… Num momento em que esta situação (miúdos) é mesmo muito preocupante… Calhando existem pouco mais de meia dúzia entre cavaleiros praticantes e amadores e mais uma meia dúzia ou pouco mais novilheiros com e sem cavalos. As oportunidades não surgem e o sonho esmorece… Evangelizar é preciso… Hoje apresentar um cartel de Figuras consagradas, Triunfadores absolutos da mais importante praça do Mundo e toureiros Emergentes é obra. Obrigado ganadero!

Dizia que ser aficionado também é uma forma de viver e enquanto houver aficionados como estes que vêm a Mourão com a esperança de comungar beleza e emoção, isto tem futuro… Mas a afición pela tauromaquia, tal como o amor, deve ser alimentada todos os dias… E é isso que se faz por aquelas paragens. Sei que quando se fecha a porta do último festival já se pensa e sonha como alimentar a aficion do ano seguinte de quem organiza e também sei que quem assiste e pensa em voltar.

O ser humano desfruta de uma obra literária, de uma pintura ou de uma peça musical já acabada, retocada pelo seu autor, perfeita, dentro das suas possibilidades… As corridas, por outro lado, são absolutamente aleatórias, imprevisíveis. É o bonito disto… Hoje houve obras perfeitas e quem teve o prazer de ver e saborear o acontecido na arena saiu satisfeito da Libânio Esquível. Também houve algumas coisas imperfeitas mas quem sabe apreciar o imperfeito tem mérito redobrado.

Um toiro e cinco novilhos da ganadaria Murteira Grave! Manso o primeiro. Bravo o segundo mas bravo. De bandeira o terceiro, de vacas! O quarto teve tanto de bom como de… manso! Mas a maneira como meteu a cara nos capotes e muleta devem ter deixado toureiro e Ganadero contentes. O quinto teve algum génio mas quando lhe apareceu a veia da entrega teve a qualidade dos bons. O sexto teve humilhação, nobreza, tranco e classe. Joaquim Grave teve direito a lenço azul depois da lide de segundo e terceiro.

Abriu praça Filipe Gonçalves, um cavaleiro de personalidade invulgar, extrema simpatia e interação com o público, alegria, transmitindo uma vibração contagiante, não deixando ninguém indiferente. A sua lide teve toureio frontal, de aguentar a investida, de arriscar em terrenos de compromisso enquanto o toiro lhe permitiu… rematou uma lide de muito empenho com um violino e palmo.

 

O mais novo da dinastia Ribeiro Telles, Tristão em ano de alternativa repetia em Mourão e lidava o primeiro Murteira Grave da sua carreira. O Tristão chega com facilidade ao público, o seu sorriso de “menino sonhador” e a sua bonomia colossal são meio caminho andado para meter o respeitável no bolso. Tem uma facilidade surpreendente para tourear e ver o que tem por diante, de analisá-los em segundos e poder prever seu comportamento futuro em diferentes situações dando-lhe a lide adequada, permitindo-lhe o triunfo…. Mas por vezes mesmo fazendo isso tudo existem contingência que acabam por comprometer o triunfo redondo… uma mão pouco acertada, acontece!

 

O toureio clássico de José Ignacio Uceda Leal surgiu este domingo de forma redundante. Uma obra soberba de Uceda Leal, de grande pureza e profundidade extraordinária. Abandonou a sua verticalidade de 1,90 e esqueceu a firmeza e os toques dos inícios da faena para relaxar a mão direita em derechazos e dar naturais a “pulso de muñeca”, rematados com passes imensos de peito. Houve toureio ao natural cumbre, de onde extraiu muletazos imaculados diante de um animal nobre e bravo que sempre ia a mais na muleta, também em redondo pela direita houve passes soberbos, rematados com passes de peito bem desenhados e passes por baixo com toreria. Faena rotunda do início ao fim, com muita entrega e arte. De início com o capote à verónica deixou o perfume do seu toureiro e despertou os primeiros olés.

Borja Jiménez é a frescura, a autoconfiança e a desenvoltura de um triunfador! Combina verticalidade e profundidade, estoicismo e naturalidade, doa-se de espírito, corpo e coração, com sensibilidade e tenacidade únicas. Na faena do toureiro sevilhano houve naturais soberbos, de profundidade indiscutível, templou e embarcou as investidas do novilho em tandas profundas em redondo. O toureio é um acto de fé e neste caso todos acabamos crendo numa religião maravilhosa que Jiménez professou. Como não!? naqueles naturais antológicos, inesquecíveis, com os voos, uma suavidade abrumadora, rematados atrás, na anca, de mão baixa no sítio em que morre o bom toureio e se acende a chama do clamor. Uma maravilha!

Juanito, é a alma… Esteve bem de capote à verónica até ao centro da arena. O João é um “louco” por o toureio e um “louco” pelo triunfo. O João, Murteira Grave e Mourão têm sido testemunhas disso ao longo dos anos, desde a sua estreia que cativou o público, que o acarinha de uma forma especial, até ao dia de hoje. Começou a faena de muleta com mando. Nas primeiras investidas, o de Murteira trouxe transmissão, coisa que Juanito soube aproveitar, metendo o público na faena. Faena de puro dinamismo, aproveitou as viagens do adversário com enorme toreria. Correu a mão por ambos os lados com “empaque” e figura ajustada. Encurtou distâncias e passes cambiados, redondos de costas, passes de peito e desplante, público de pé.

O seu conceito e as suas mãos templando as investidas dos oponentes com um toureio clássico e profundo prendem e despertaram o entusiasmo por este novo valor do toureio, este é Jorge Martinez. Talento, técnica e arte são os elementos básicos que aliados à personalidade e autenticidade fazem que se destaque dos demais. Elegância, valor e pureza fazem parte da identidade própria de Jorge Martínez, o que lhe confere a capacidade de criar de forma simples, com arte e harmonia tornando aquilo que é fiero e explosivo em estética e emoção tanto para o público como para os aficionados. A faena de Martínez, teve modos e formas de bom toureio, toureou lento e ritmado por ambos os lados nos médios. Deu distância ao novilho, toreando bonito em redondo e ao natural, finalizando as séries de forma brilhante com passes de peito. Terminou a lide com excelentes séries circulares com o toureiro muito arrimado.

Os forcados vieram da Velha Pax, Beja, em ano que se despede das arenas o cabo Miguel Sampaio, Mourão foi o primeiro palco do seu adeus.

Abriu praça, Nuno Barreto numa pega que levantou o público dos assentos, tudo bem feito desde o cite, reunião e viagem num toiro que não se mostrava fácil.

O segundo novilho da corrida foi pegado por Alexandre Rato, também à primeira tentativa.

Dirigiu a corrida Agostinho Borges, sendo a médica veterinária Ana Gomes

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